domingo, 29 de julho de 2007

Um dia cai - notas dominicais XII

"É um orgulho estranho, a confirmação de um talento nato pra não trabalhar. Como levar um fora de uma mulher que você sabe que não te merece. Enche um homem de certezas. Não tenho, mas sei que o dinheiro está lá. Existe, espalhado pelos bolsos de quem risca as ruas com carros importados, lota restaurantes, shoppings, bares, hotéis caros, está nos bancos, em barcos, boates, aparelhos de ginástica, maconha da boa, pó, tarjas pretas, eletrodomésticos, vista pro mar, putas de cabelo amarelo; eu posso sentir, eu posso tocar o dinheiro, posso sentir seu cheiro de vestiário, esse cheiro de cu, o tato nojento do dinheiro, o caminho de intestino que o dinheiro faz até nós. Um dia cai no meu bolso. Continuo fazendo o que eu faço, esses empregos de merda, escrevendo isso aqui. Um dia cai. E me abaixo pra pegar."

(trecho de Corpo presente, romance de João Paulo Cuenca)

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