"Yo llevo en el alma un camino
destinado a nunca llegar"
(trecho da canção Desaparecido do Mano Chao)
domingo, 29 de novembro de 2009
E tu vai pra onde, esse minino? - notas domênicas
sexta-feira, 27 de novembro de 2009
O Recife também é assim:
No meio da noite de ontem, o gringo tomou a palavra no turbilhão de opiniões e deu-lhe de tiro certeiro:
"Descobri que em Recife o rito de passagem para virar adulto é criar um desafeto."
Petição contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto - utilidade pública
Para apoiar essas lutas, clique aqui e assine!
quinta-feira, 26 de novembro de 2009
Em Recife é assim...
Rua da Imperatriz, Centrão, ontem por volta das 16h, rolava a performance Baby dolls – uma exposição de bonecas, criação do Obscena Agrupamento Independente de Pesquisa, trupe mineira convidada pro XII Festival Recife de Teatro Nacional. Duas senhoras de meia-idade param e obervam um tantinho as mugangas do grupo -atuação política e bem intencionadíssima, diga-se de passagem. Uma olha pra outra e decreta: “Bora simbora senão quem vai ficar doida é a gente!”. E o cheiro de maré sobe, carimbando o solo onde piso...
(passagem adaptada em roubo ao Jornal do Commercio de hoje)
quarta-feira, 25 de novembro de 2009
A Ilustrada é nossa!
Na sequência da crítica do novo disco de Otto, a Folha de São Paulo publica hoje matéria e crítica sobre mais um fenômeno musical pernambucano:
João do Morro conquista o Nordeste
THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL
Junte na mesma canção pagode, samba, funk e afoxé. Tempere com letras que retratam pequenos fatos do cotidiano com humor afiado. Bem, assim é João Pereira da Silva Júnior. Aos 32 anos, ele adotou o nome João do Morro e é hoje um dos principais nomes da borbulhante cena de Recife.
João do Morro faz cerca de 20 shows por mês na capital pernambucana, suas apresentações estão documentadas e (bem) visualizadas no YouTube e ele lançará o primeiro disco "oficial" em 14 de dezembro.
"Oficial" entre aspas porque nas carrocinhas que passeiam pelas ruas de Recife vendendo CDs piratas há diversos disquinhos com faixas como "Papa-Frango" e "Frentinha", hits de João do Morro.
"As carrocinhas fizeram com que minhas músicas ficassem conhecidas, que chegassem ao interior de Pernambuco, em Alagoas, Rio Grande do Norte. Por isso não posso ser contra a pirataria", afirma à Folha.
João do Morro não é contra a pirataria e não é contra a internet. Possui conta no Twitter (twitter.com/joaodomorro) e no MySpace (www.myspace.com/joaodomorro), por exemplo. "A internet foi um dos mecanismos que me ajudaram na divulgação."
Mas, claro: o que adianta Twitter, MySpace, carrocinhas, se as músicas não ajudam? As músicas de João do Morro são uma síntese de como ritmos regionais e populares podem ser trabalhados como algo de apelo pop e universal.
"Não consegui definir ainda", diz ele, sobre suas músicas. "É uma fusão entre pagode, samba, afoxé e swingueira. Fiz essa misturada, mas não sei dizer qual é o resultado."
Swingueira? "É um pagode mais suingado, em que fazemos coreografias, passos de dança", explica o cantor.
Um dos principais sucessos de João do Morro, "Papa-Frango" nos apresenta a história de um garoto gay que é sustentado por um homem mais velho.
"A inspiração veio de quadrilhas juninas, muito frequentadas por gays. É algo antigo até."
A música fez com que o cantor fosse acusado de homofobia por associações de Pernambuco. E o que fez João do Morro? Compôs "Frentinha".
"Eu não tenho preconceito/ Se você olhar direito/ Hoje em dia o mundo é gay/ É boyzinho com boyzinho/ E boyzinha com boyzinha/ É todo mundo se beijando/ Se amando, se abraçando", diz a pepita.
João do Morro foi criado no Morro da Conceição (daí o apelido). Pai e irmãos tocavam na Galeria do Ritmo, uma escola de música que desfila no Carnaval pernambucano. Com autorização do pai, desde os 16 anos participa de shows de pagode. E, até pouco tempo atrás, trabalhava como açougueiro.
"Eu achava que ficaria restrito ao pagode e à periferia. Mas hoje faço shows na zona sul de Recife, em boates badaladas [e em festivais como o Rec Beat]. Tanto o cara do morro como o cara que tem uma cobertura em Boa Viagem curtem as músicas, pois as letras falam do dia a dia de forma humorada."
Sobre o que o inspira, João do Morro elenca: "Peguei um pouco de cada coisa. Um pouco da personalidade do Zeca Pagodinho, que faz sucesso mas não perdeu a cabeça. De outras coisas, peguei a postura de palco. O deboche veio com Mamonas Assassinas, Tom Cavalcante. Mas, desde 1992, quando descobri Bob Marley, gosto de reggae. Já fiz uma versão "enrolation" de "No Woman No Cry", porque não falo inglês...".
A arte do fenômeno "cafuçu"
XICO SÁ
COLUNISTA DA FOLHA
Não há mistério algum no samba de João do Morro, caros apanhadores de folclores e exotismos. Nem samba é, na maioria das vezes, é gréia, como se traduz livremente no Recife a arte do chiste, da zorra, da tiração de onda.
A graça da sua fuleiragem social clube é usar nas letras o dicionário mais "cafuçu" possível, o glossário peba, tosco, além do brega sentimental e da simples filosofia popular de consolação do corno -algo tão comum na canção romântica.
No pagode do artista, entra o boyzinho (rapaz) suburbano que recebe mimos e é sustentado pelo frango (gay no Recife). E que fique claro: o ativo, nessa pegada, nunca é considerado homossexual. O "Papa-frango", título da faixa de sucesso, é motivo de chacota pela moral econômica de não bancar sua vida.
Para o ouvinte que não conhece as expressões recifenses, o enredo pode soar um pouco incompreensível na primeira audiência. O show de João é o seu vocabulário, como diz em "As Nêga Endoida", dirigindo-se a quem o chama para animar os bailes.
A crônica sobre a boyzinha (garota) que corre da chuva com medo de estragar a chapinha todo mundo entende. A letra relata o fenômeno de abertura dos salões de beleza nas periferias e rima o estoque inteiro de técnicas e produtos para o cabelo: "Umas passam easy, outras biorene/henê, hairfly, guarnidina e kolene".
Badalado a partir das carrocinhas e "publicicletas", veículos que vendem CDs e DVDs piratas, João do Morro e a banda "Os cara" esticaram seus hits para a internet, via blogs e Myspace etc. "Chupa que é de uva", diz o "cronista da comunidade", como se define, usando a provocação que dá nome a um outro dos tantos sucessos.
Sua origem é o Morro da Conceição, no bairro de Casa Amarela, zona norte, o mais populoso da cidade. Não há segredo no pagode. É a linguagem da "poeira" (povão no dicionário popular do Recife) nas letras e música fácil e sem frescura emepebística. Como diz Fred 04 em um dos seus sambas esquema noise, não tem mistério. Tem não.
terça-feira, 24 de novembro de 2009
Um bom discurso sobre a Confecom
Clique aqui e veja o discurso de Joaquim Ernesto Palhares, diretor-presidente da Agência Carta Maior, na Conferência Estadual de Comunicação de São Paulo. Vale a pena!
Nueva ley de medios
E por falar em comunicação, olhem só a nova lei argentina sobre os meios. E é aqui do lado...
segunda-feira, 23 de novembro de 2009
Certa manhã acordei pra (não) escrever...
Faz é tempo que tô querendo passar por aqui e contar das coisas que recentemente vem alimentando o espírito desta carcaça tão estranha quanto o mais comum dos homens.
Pois bem, poderia discorrer sobre a beleza que é Loki, o documentário sobre Arnaldo Baptista, e sobre a pancada que é Anticristo, mais uma obra-prima do dinamarquês Lars von Trier. Isso só pra ficar nesse negócio de cinema, essa arte cara, conforme bem diagnosticou o taperoaense Ariano Suassuna.
Na música, soltaria o verbo e rasgaria a ceda sobre 3 trabalhos recentes: Uhuu!, do Cidadão Instigado; Dança da Noite, de Zé Cafofinho & Suas Correntes (o universo de rua do velho Recife nas suas fuleiragens e safadezas - esse ainda devo uma resenha!); e o visceral e fuderoso (e não teria outros adjetivos tão ao nível do) Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos, do galego Otto.
Mas acreditem, mesmo com tanta sustância, ainda não será desta vez que gastarei um tantinho de prosa sobre essas maravilhas - é que ando numa fase venha a nós, ao vosso reino ofereço apenas minhas recomendações que, acreditem, não são fracas... Mas se não escrevo eu, que escrevam os outros! E essa ladainha toda é só pra divulgar a crítica publicada hoje nas folhas dos Frias sobre o último disco citado acima. É dor, inferno, coração e salve!
Em meio ao caos, cantor encontra equilíbrio
BRUNO YUTAKA SAITO
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA
Fosse um inseto, como sugere na referência a "A Metamorfose", Otto seria daquelas baratas que não morrem na primeira chinelada.
Ele ressurge revigorado, ilustrando a ideia romântica de que momentos de crise geram belas obras de arte. "Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos" é, de longe, o melhor e mais vigoroso disco de Otto.
Isso porque, desta vez, ele está livre de amarras. Não é mais um produto da bem-intencionada mas sem sal "geração Trama", gravadora que tentou emplacar novos nomes na MPB, e nem é mais representante da mistura de eletrônica com o regional brasileiro, que, em 1998, parecia ser muito moderno.
Otto finalmente se acertou com sua real turma. O novo disco é mais um fruto da já gloriosa "safra 2009", ano excepcional para a música brasileira.
Fernando Catatau (Cidadão Instigado), por exemplo, deixa sua marca registrada nas guitarras psicodélicas e emotivas de faixas como "Filha" e "Meu Mundo Dança"; Pupillo e Dengue (Nação Zumbi) criam a tensão necessária para Otto exorcizar demônios, mais do que apenas lamuriar; o ar afro de Céu está em "O Leite", e a mexicana Julieta Venegas confere "latinidade" a "Lágrimas Negras" (Jorge Mautner/Nelson Jacobina) e "Saudade".
Se em alguns momentos é mais visceral, sem medo de falar das fraquezas, está mais próximo da dor de Walter Franco que do romantismo de Roberto Carlos. Na épica "6 Minutos", canta: "Até pra morrer, você tem que existir/.../nasceram flores num canto de um quarto escuro". Desta vez, a música é bem maior do que o personagem.
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CERTA MANHÃ ACORDEI DE SONHOS INTRANQUILOS
Artista: Otto
Lançamento: Arterial Music (distribuição: Rob Digital); R$ 26,30
Avaliação: ótimo
domingo, 22 de novembro de 2009
sexta-feira, 20 de novembro de 2009
De grão em grão
A I Conferência Nacional de Comunicação já deu as caras aqui neste blog algumas vezes. Pois é, ela se aproxima, será entre os dias 14 e 17 de dezembro em Brasília. Boicotada pela grande mídia e mal costurada pelo Ministério das Comunicações (parte cedida desse nosso governo de coalizão), pouca coisa deve ser conquistada no sentido de uma maior democratização dos meios comunicacionais do país.
No entanto, apesar das condições em que ela se desenrolará, o processo da Conferência - talvez o evento político mais importante do ano - vem gerando debates e tem servido pedagogicamente para chegarmos a alguns consensos em torno das problemáticas e necessidades de nossas mídias. O jornalista Altamiro Borges enumera alguns desses consensos:
1) novo marco regulatório, que coíba a concentração do setor e garanta a diversidade informativa;
2) revisão dos critérios de concessão pública para as emissores privadas de rádio e TV;
3) fortalecimento da rede pública de comunicação;
4) fim da criminalização da radiodifusão comunitária;
5) política pública de inclusão digital, garantindo “banda larga para todos”;
6) revisão dos critérios da publicidade oficial, incentivando a pluralidade;
7) medidas de estimulo à participação popular e ao controle social, com a criação dos conselhos de comunicação.
Também pedagogicamente, o processo da Conferência tem contribuido para tirar o véu que encobre aqueles que mandam e desmandam no meios de comunicações brasileiros. Visto que, como coloca o mesmo Altamiro, "quando o governo Lula finalmente decidiu convocar a conferência, eles tentaram sabotá-la. Num gesto desesperado, seis das oito entidades empresariais abandonaram a comissão organizadora do evento. Com isso, os barões da mídia demonstraram que não têm qualquer compromisso com a democracia; que o discurso da 'liberdade de expressão' é pura retórica; que eles não defendem a 'liberdade de imprensa', mas sim a 'liberdade dos monopólios'." (in: A virtude pedagógica da Confecom)
Rumo a um primeiro passo pela democratização dos meios no país!
terça-feira, 17 de novembro de 2009
Sem largar o osso
A elite brasileira chora pra largar o osso...
A sociologia do pânico
Por Liszt Vieira* e Aloysio Carvalho**
Com a aproximação do fim do mandato de Lula e o acirramento das disputas em torno do poder político, surgiu uma nova abordagem no meio acadêmico, mais especificamente no campo sociológico. Seu objeto são as eleições de 2010, e sua metodologia a difusão do pânico. A sociologia do pânico substituiu os economistas do desastre que alimentaram na mídia liberal conservadora o diagnóstico de que o governo Lula iria jogar o país numa crise sem precedentes.
Ocorre que o capitalismo brasileiro, como reconhecem praticamente todos os economistas, tornou-se sólido, com um setor industrial desenvolvido, um mercado interno em expansão, um forte agronegócio, e um sistema financeiro organizado, que atravessou sem maiores problemas a crise mundial de 2008.
Como a economia vai bem, a oposição se voltou para o sistema político, com foco no executivo, alvo de seus prognósticos catastróficos. Em texto amplamente divulgado pela imprensa, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sustenta que “o DNA do autoritarismo popular vai minando o espírito da democracia constitucional” e acrescenta que “vamos regressando a formas políticas do autoritarismo militar”.
O presidente Lula deteria “um poder sem limites”, de caráter burocrático-corporativo. Como a vitória de Dilma possibilitará a emergência do subperonismo no Brasil encarnado na figura de Lula, é preciso dar um basta no continuísmo antes que se consolide o atraso representado na aliança entre Estado, sindicatos, movimentos sociais, fundos de pensão e grandes empresas, cada vez mais fundidos nos altos fornos do tesouro.
Na mesma linha de raciocínio encontra-se o texto do sociólogo Werneck Vianna apropriado por um colunista de O Globo. O governo Lula faz uma volta ao passado com a revalorização do Estado Novo e dos governos militares, cujas doutrinas remontam a Oliveira Vianna e Alberto Torres. Os mortos continuam comandando os vivos e o espírito da Ibéria cobra o seu preço diante de um mercado que não consegue se auto-regular. Como decorrência, a democracia brasileira perde seus fundamentos quando a “sociedade em sua diversidade se deixa submeter ao Estado, conferindo à liderança de um chefe de governo carismático a tarefa de cimentar a unidade de seus contrários”.
Pouco depois, o historiador Carlos Guilherme Mota, em entrevista ao jornal Estado de São Paulo, critica Lula e diz que seu governo é pior do que subperonismo, porque "o peronismo politizava e o pobrismo do Brasil avilta"...
O que há de comum nessas interpretações? Mais do que a preocupação liberal com o equilíbrio de poder entre as instituições, o que está em jogo é o poder político e os recursos disponibilizados pelo Estado. Afinal, como até há pouco tempo prevalecia a tese de “primeiro crescer para depois repartir”, a melhora da qualidade de vida da população não acompanhou o crescimento econômico do país.
Nesse ponto vale resgatar o pensamento de Florestan Fernandes, cuja obra tornou-se clássica na sociologia brasileira. O mestre Florestan continua atual e foi claro no livro “A Revolução Burguesa no Brasil”. A burguesia no Brasil detêm um forte poder econômico, social e político, de base e de alcance nacionais. Sempre atua e reage preventivamente quanto às mudanças mais profundas que devem ser realizadas para expandir a democracia no Brasil.
Uma dessas mudanças é, sem dúvida, a redução da desigualdade social. Basta uma rápida comparação na distribuição da renda nos governos FH e Lula. São inversamente proporcionais. No governo FH, a renda caiu vertiginosamente; no governo Lula, subiu de forma expressiva. No que se refere ao desemprego, o fenômeno foi exatamente o inverso, conforme mostram os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 2008/IBGE.
O governo Lula ampliou o mercado interno trazendo para a esfera do consumo as classes C e D que passaram a constituir demanda para a pequena e média empresa em todo o país. Isso contribuiu para o crescimento econômico, assegurado sem inflação, com aumento real de poder aquisitivo para as camadas de baixa renda.
Os estímulos concedidos pelo governo levaram a uma rápida superação da crise econômica. Isso explica porque o objetivo de alguns sociólogos da oposição é semear o pânico no campo político, já que no econômico o governo Lula teve excelente desempenho, ao contrário do que previam os economistas liberais sempre presentes na mídia.
Mas, também no campo político, esses sociólogos vão malhar em ferro frio. O governo Lula é talvez o mais democrático da história política brasileira. Além disso, fortaleceu o Brasil no cenário internacional em função dos interesses brasileiros e latinoamericanos, rompendo com a dependência tradicional em relação aos interesses norteamericanos.
As elites estão divididas. Alguns segmentos estão satisfeitos com a situação econômica. Outros, mais ligados ao poder político, estão desesperados e tentam manipular a opinião pública por meio da mídia.
Lula está sendo criticado mais pelas suas virtudes do que pelos seus defeitos. É curioso observar que esses críticos não abordaram a questão da ética, nem atacaram, por exemplo, o lado mais vulnerável do governo que é a questão ambiental.
O governo brasileiro reluta em levar metas definidas à conferência da ONU sobre clima, em Copenhague. O Brasil pode, mais uma vez, perder a chance de assumir liderança mundial na questão climática que se torna hoje uma prioridade global.
Mas a sociologia do pânico nem tocou nesse assunto, influenciada certamente pela visão produtivista que predomina no mercado. É pena, porque dentro de vinte ou trinta anos os governos vão ser julgados menos pelas obras e mais pelo que fizeram para combater o aquecimento global e evitar as mudanças climáticas que ameaçam a humanidade.
Essas questões, porém, passam longe das preocupações da sociologia do pânico, interessada apenas no poder político em jogo nas eleições presidenciais de 2010.
*Liszt Vieira é Sociólogo, Professor da PUC, Presidente do Jardim Botânico do Rio.
**Aloysio Castelo de Carvalho é Professor da Faculdade de Economia da UFF e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFF.
(Texto publicado no site Agência Carta Maior)
domingo, 15 de novembro de 2009
Beethovens - notas domênicas
"O que pode ser repensado é o estatuto da noção de criação, não para dizer que não é mais possível criação, mas para redefini-la de uma maneira criativa, digamos assim. Temos que criar um outro conceito de criação. Trabalhamos atualmente com um conceito, por um lado, velho como o cristianismo (criação bíblica) e, por outro lado, com o do romantismo, a criação como manifestação, emanação de uma sensibilidade sui generis do indivíduo privilegiado. Esses dois modos de conceber a criação não dão mais conta do que está se processando nesse mundo atual. Está havendo tanta criação quanto havia antes, não creio que esteja havendo menos. O que houve foi uma mudança das condições. Mudaram as condições de criação, mudaram as condições de distribuição. Mas Beethoven não vai aparecer de novo, não porque um gênio como Beethoven não pode aparecer de novo, não é esse o problema. Pode aparecer com certeza, se é que já não há um milhão deles por aí, talvez tenha muito mais do que naquela época, já que há muito mais gente no planeta. O que não existe são as condições iguais às que tinha Beethoven para ser um Beethoven. As condições de restrição do ambiente cultural da Europa, o tipo de formação cultural que existia, o tipo de tradição de transmissão da informação. Os 'Beethovens' de hoje tão fazendo outra coisa, não sei o quê exatamente. A criação artística está ficando cada vez mais parecida com a criação científica, que sempre foi um trabalho em rede, em que você trabalha em cima do trabalho dos outros, que exige todo um aparato institucional complexo de produção propriamente coletiva."
(outro trecho da entrevista do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro no livro culturadigital.br)
domingo, 8 de novembro de 2009
Pequenas divindades românticas - notas domênicas
..."toda nossa teoria da criação é a de que existe uma oposição radical, uma oposição intransponível entre criação e cópia. O criar e o copiar são os dois extremos de um processo, quer dizer, o criador é aquele que precisamente tira de si tudo o que precisa, e o plagiário é aquele que tira dos outros. O plagiário é um saqueador, e o criador é o doador absoluto. A dádiva é uma modalidade da criação, a criação é uma modalidade da dádiva, talvez a criação seja a dádiva pura, e aí você vê bem as raízes teológicas desse modelo: Deus criou o mundo do nada, tirou de si mesmo. A criação é o modelo do poeta, do criador como uma divindade no seu próprio departamento, que é o modelo romântico do gênio como um criador, um pequeno deus, uma pequena divindade, que tira de si mesmo a criação."
(trecho da entrevista do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro no livro culturadigital.br)
domingo, 1 de novembro de 2009
Quer que embrulhe? - notas domênicas
"A prática recombinante, para a indústria cultural, foi banida. Ela é banida a partir do momento que você precisa construir uma lógica mercantil da cultura. Então aquilo que é o estilo basicamente comunitário, comum de uma dada região. Para falar como surge o jazz, o que é preciso fazer? Você tem que começar a especializar os caras que tocam jazz, especializar cada um na sua função. Você precisa dar, cada vez mais, uma lógica de individualidade, de autoria. Você faz isso e a partir desse momento você pode começar a dizer que é importante para a cultura aquele fenômeno que é vinculado à genialidade, e essa genialidade se expressa basicamente numa coisa que é quase mística. 'Eu crio porque eu sou genial'. Eu não tenho nenhum contato com a cultura, ou esse contato é extremamente secundário. Isso acontece também na ciência, mas menos. É tipicamente das artes, porque as artes foram empacotadas e transformadas em mercadorias, e aí você precisa claramente criar uma figura que é acima da cultura, acima do comum, acima da produção coletiva. E essa figura é o autor, que é genial e que cria uma obra completamente original, sem precedentes. Então a indústria cultural está sempre atrás disso."
(trecho da entrevista de Sérgio Amadeu no livro culturadigital.br)