"Não acredito na felicidade - estou lhe dizendo a verdade. Acredito apenas na inquietude. Ou seja, nunca estou feliz por completo - sempre preciso fazer outra coisa. Mas admito que na vida existem felicidades que duram dez segundos ou meia hora, como quando nasceu meu primeiro filho - naquele instante, eu estava feliz. Mas são momentos muito breves. Alguém que é feliz a vida toda é um cretino. Por isso, antes de ser feliz, prefiro ser inquieto."
Umberto Eco, trecho de entrevista publicada na Folha de São Paulo (11/05/2008)
"Sempre senti que a vida é uma confusão muito grande. Tenho uma visão sombria e pessimista da vida e da fé do homem, da condição humana. Mas acho que há alguns oásis extremamente divertidos no meio dessa miragem. Há momentos de prazer e momentos que são divertidos, mas, basicamente, a vida é trágica."
Woddy Allen, colhido em algum lugar poraí...
domingo, 29 de junho de 2008
Vida, esta felicidade! (variações sobre o mesmo tema) - notas dominicais
quarta-feira, 25 de junho de 2008
100 Trindade (eraOdito)
Em meio as comemorações do centenário de morte de Machado de Assis, passou em branco os 100 anos de nascimento do poeta Solano Trindade completados ontem. Não para o escritor Marcelino Freire, que no seu eraOdito (blog de primeiríssima!) lhe dedicou a homenagem que transcrevo abaixo.
Dois vivas para os dois!!
100 TRINDADE
Beirei-me à tarde lembrando dos cem anos, hoje, do poeta Solano Trindade. Nascido negro, em 1908, na cidade do Recife. E aí pensei em artistas assim: como o Pernalonga. Que morreu por falta de socorro. Explico: era ator marginal de Olinda. Portador do vírus da AIDS. Fazia campanha de prevenção e todo mundo sabia. Da sua alegria doente. Foi assaltado-esfaqueado, de repente. E mingüou em uma das ladeiras de Olinda. Sangrou sem ajuda. O povo não queria ser contaminado. Deixaram-no, feito cachorro, morrer. Mas por que estou rosnando isto? Em dia tão festim-festivo? Repito: centenário do Solano. E eu recordando alguns versos do pernambucano, gingados-recitados, outrora, pelo Pátio de São Pedro. Pelos meus amigos atores, como o Pernalonga. Por escritores teimosos de minha terra. E aí vem outra imagem: a do poeta Miró. Do bairro da Muribeca. Este, uma vez espancado porque estava sorrindo, sozinho, a caminho de casa. Por que este riso na cara? E a polícia caiu de pau. E Miró hoje tem uma poesia visceral. Cantada de dor. Rasgada. E tanta coisa chega à minha caixola. Morro da Providência. Sem providência. Esse meu coração abobalhado. Demagógico. Sei, sei. Ora, ora. Memorializo o tempo em que eu fazia teatro no bairro cariado de Água Fria. E da professora Ilza Cavalcanti que disse-me um dia: "você tem futuro". Quando eu escrevia coisa sem vida. Branca pele pálida. E aí vim para São Paulo. Desde 91. E sempre me indagam de onde vem este meu som inflamado. Esses meus contos-descasos. Descamisados parágrafos. E eu lembro do Solano. E do Bandeira, em outra beira. De beco. Tuberculoso. E eu sinto saudades e raiva. E aí eu penso em tanta gente por aqui. Dentro da cidade de São Paulo. Sérgio Vaz, por exemplo. E eu saúdo o Solano. No exibido ano do Machado. E eu deixo aí embaixo um poema do Trindade. E mais não deixo. Talvez um beijo e aquelabraço. Fui.
Gravata Colorida (S.T.)
Quando eu tiver bastante pão
para meus filhos
para minha amada
pros meus amigos
e pros meus vizinhos
quando eu tiver
livros para ler
então eu comprarei
uma gravata colorida
larga
bonita
e darei um laço perfeito
e ficarei mostrando
a minha gravata colorida
a todos os que gostam
de gente engravatada...
terça-feira, 24 de junho de 2008
Faz tempo que eu tava pra anunciar aqui o super blog O Biscoito Fino e a Massa, do professor do departamento de português e espanhol da Universidade de Tulane-EUA, Idelber Avelar. Pois chegou a hora. O espaço, auto-definido como "anti-apocalíptico", já existe há quase 4 anos na blogosfera e versa sobre política, música, futebol e literatura. Bacaníssima fonte de contra-informação, não deixem de ir lá (link também ao lado na seção Estranhos rizomas).
Ps.: Mais para as damas. Por esses dias visitei um blog engraçado que trata do universo feminino, mais precisamente das desventuras amorosas de nossas costelas. Atende pelo científico e delicado nome de Morfologia da Pica. Vale umas risadas...
domingo, 22 de junho de 2008
Liberdade de imprensa - notas dominicais
“Como a produção de jornais e revistas requer cada vez mais capital, o grupo de pessoas com capacidade de publicar nos órgãos de imprensa está se reduzindo constantemente. A liberdade de imprensa é a liberdade para duzentas pessoas endinheiradas difundirem suas opiniões... Livres são os ricos e, como os jornalistas não são ricos, também não são livres.”
Do conservador alemão Paul Sethe, antigo funcionário de dois dos principais jornais da Alemanha, o FAZ e o Die Welt.
quinta-feira, 19 de junho de 2008
Indisponíveis e detestáveis (da série "Pensamentos Avulsos" 3)
Quer saber?, detesto as pessoas que não podem dispor da sabedoria do homem comum.
terça-feira, 17 de junho de 2008
Instinto de interatividade
No último sábado, o Prosa & Verso (suplemento literário do jornal O Globo) foi inteiramente dedicado ao centenário de morte do escritor Machado de Assis. Nele, críticos como Roberto Schwarz, Renato Cordeiro Gomes, Silviano Santiago, entre outros, deixaram suas impressões sobre o bruxo do Cosme Velho. O ensaio de Silviano Santiago tratou de um artigo escrito por Machado no ano de 1871. Trata-se de "Instinto de Nacionalidade", texto que, coincidentemente, eu acabara de ler.
Já naquela época, o autor de Dom Casmurro chamava a atenção para os perigos dos excessos de localismos (regionalismo, brasilidade etc.) que podem empobrecer a literatura (como culturalista, acho que o raciocínio é válido pras realizações culturais de forma geral), conforme ilustra esta passagem:
"Não há dúvida que uma literatura, sobretudo uma literatura nascente, deve principalmente alimentar-se dos assuntos que lhe oferece a sua região, mas não estabeleçamos doutrinas tão absolutas que a empobreçam. O que se deve exigir do escritor antes de tudo, é certo sentimento íntimo, que o torne homem do seu tempo e do seu país, ainda quando trate de assuntos remotos no tempo e no espaço."
(quem quiser ler na íntegra, o que aconselho, clique aqui)
Voltando dos méritos de Machado para o ensaio de Silviano, este termina sua exposição com o seguinte comentário: "Do ensaio vem também o alerta geral para os blogueiros: 'Outra coisa de que eu quisera persuardir a mocidade é que precipitação não lhe afiança muita vida aos seus escritos'."
Sem dúvida uma cutucada para os que, como eu, depositam seus parágrafos nesta ferramenta. Porém, creio numa outra lógica possível no "exercício blogueiro". Não o desejo narcísico da posteridade, mas sim, além do treino da escrita, a interatividade com virtuais leitores e comentadores. O que, convenhamos, pode ser bem bacana.
Antiga Vila Rica, numa tarde de frio de lascar.
domingo, 15 de junho de 2008
A legitimação da cachaça - notas dominicais
"A situação revolucionária desta bosta mental sul-americana apresentava-se assim: o contrário do burguês não era o proletário - era o boêmio."
(Oswald de Andrade em Serafim Ponte Grande)
sexta-feira, 13 de junho de 2008
Exílio mineiro
Aos que frequentam esta bodega eletrônica, peço licença. Passarei uns 10 dias em Minas Gerais e não sei como será o meu webmundo por lá. Portanto, se novos posts não aparecerem, não significará o fim deste jardim de pixels. Vou e volto. Com sorte, apanho uns parágrafos no caminho... Fui.
terça-feira, 10 de junho de 2008
Concurso, Antônio Cândido e o Sport Club do Recife
Há 2 meses venho estudando para prestar concurso numa universidade. Estudando não, tentando estudar, pois meu time não deixa. Claro que refiro-me ao glorioso Sport Club do Recife que amanhã joga a finalíssima da Copa do Brasil, sua última partida na competição. Gracias, é o caso de escrever. Isto porque já não aguento mais a movimentação futebolística como método para o refúgio da labuta - tenho com o esporte bretão minha única relação metafísica, uma religião.
Foram dias e dias frequentando sites, programas de tv, fóruns esportivos de toda sorte (inclusive as velhas resenhas radiofônicas do Recife cotidianamente pela web) na ansiedade de colher a mais recente informação sobre o escrete rubro-negro. Pra piorar o meu envolvimento, na última semana ainda houve o caso do estádio dos Aflitos que terminou por deflagrar uma verdadeira guerra regional mediante as arbitrariedades da justiça esportiva brasileira. Era o que faltava pra juntar a fome com a vontade de comer.
Pois bem, hoje no primeiro turno de trabalho, ao ler Iniciação à Literatura Brasileira*, obra do crítico Antônio Cândido, encontrei dois trechos que transcrevo abaixo na intenção de: 1) aliviar minha culpa, ao unir obrigação e dispersão; 2) convocar a torcida de todos pelo Leão da Ilha do Retiro no jogo desta quarta. Ao autor então, que na passagem que trata d'Os Sertões escreve:
"Graças à conjunção de um acontecimento dramático, da férvida imaginação de um observador privilegiado e da força de um estilo enfático, a opinião pública sentiu que a sociedade brasileira repousava sobre a contradição entre o progresso material das áreas urbanizadas e o atraso que marginalizava as populações isoladas do interior. Faltou a Euclides da Cunha apenas salientar a miséria que acompanha esta situação de abandono, para mostrar que se tratava de algo quase tão grave quanto a escravidão, que tinha sido abolida pouco antes. Ele baseou o seu livro no esquema determinista em voga naquele tempo, indicando como o meio físico e a raça condicionavam os grupos sociais, e como a diferença de ritmos da evolução gerava desarmonias catastróficas. A sua escrita transforma a pretendida objetividade científica em testemunho indignado e lúcido, resultando em denúncia do exército e da política dominante."
E duas páginas depois:
"A sociedade brasileira é assustadoramente desigual quanto aos níveis econômicos e os graus do progresso técnico. Daí produzir tipos extremos, que por sua vez produzem maneiras muito discrepantes dos grupos sociais se verem e se avaliarem. Baseado na descrição de áreas rurais pouco desenvolvidas, o regionalismo teve aspectos positivos, como destacar as culturas locais, com seus costumes e linguagem. Mas teve aspectos negativos, quando viu no homem do campo um modelo meio caricatural que o homem da cidade se felicitava por haver superado, e lhe aparecia agora como algo exótico, servindo para provar a sua própria superioridade e lhe dar um bem-estar feito de complacência."
Amanhã, rumo a um instante, ao menos, de igualdade e glória...
*O melhor: quem quiser baixar este livro, um ótimo resumo da história da literatura brasileira, liberadíssimo na rede. É só clicar aqui, vale demais!!
domingo, 8 de junho de 2008
sexta-feira, 6 de junho de 2008
Ainda no Rio...
Esqueci de informar ontem no post: também neste final de semana, só que no sábado (07/06), primeiro show da Orquestra Contemporânea de Olinda no Rio. Com um super-time de músicos (que inclui a fera Maciel Salu), ela toca na festa Ronca Ronca que acontece no Estrela da Lapa. Pra quem não conhece, recomendo. Primeiríssima...
quinta-feira, 5 de junho de 2008
Fome no Circo
Para os que estarão no Rio, nesta sexta dia 06/06 no Circo Voador, Fome de tudo, último trabalho da Nação Zumbi. Mais informações aqui.
terça-feira, 3 de junho de 2008
Por uma nova genealogia da palavra "cultura"
São incríveis as transformações de sentido (ou semânticas, para os que gostam do vocabulário mais fino) que as palavras sofrem ao longo do tempo. Vejamos o caso de uma tão em voga nos dias que correm, a palavra "cultura".
Derivada da latina "colere", que significa "habitar", "cultivar", "proteger", foi a partir do século XVIII que ela ganhou sentidos próximos dos dias atuais: 1) substantivo abstrato que indica modo particular de vida, quer seja de um povo, um período, um grupo ou da humanidade em geral (mais próxima de um sentido antropológico); 2) substantivo abstrato que descreve as obras e as práticas da atividade intelectual e, particularmente, artística.
Na segunda metade do século XX, com o estabelecimento pesado da economia de mercado, "cultura" foi transformada em um desejo metafísico universal. Isto porque, mediante a herança de civilidade que o termo carrega, na sociedade do consumo ela funciona como uma espécie de "mercadoria divina": nada como o álibi do dispêndio cultural, o investimento para a alma. Sob o impulso consumista (e aliado a pressão do medo de ficar de fora das conversas nos círculos sociais), passou-se a adquirir "cultura" (e "arte", outra danada!) da mesma forma como se compra o novo modelo de calça da estação - afinal, tudo foi devidamente oferecido, ou melhor, comercializado para se mostrar.
Neste mesmo momento histórico, por outro lado, para os excluídos da festa do livre comércio, "cultura" terminou ganhando um sentido bélico, próximo ao que lhe conferiu o famigerado e sombrio ministro da propaganda e da informação de Hitler, Joseph Goebbels (sampleado por Cadão Volpato no Fellini), que lhe atribuía a seguinte sinonímia:
"Quando ouço a palavra cultura, saco meu revólver".
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Agora é sério. Esta recente valorização da "cultura" atingiu - além do mercado, claro - praticamente todas esferas da vida social. No universo acadêmico, por exemplo, vários centros universitários no mundo instituíram o ensino de uma nova e paradigmática (anti)disciplina: os estudos culturais.
Originários da Escola de Birmingham, Inglaterra, os estudos culturais se desenvolveram como um campo de pesquisa para a investigação da "cultura" nas sociedades (pós)industriais contemporâneas. Uma característica importante de sua atuação é o compromisso de interagir diretamente com as práticas políticas, sociais e culturais. Nas últimas décadas, expandiram-se para os Estados Unidos, outros países da Europa e da América Latina e hoje são reconhecidos como uma ferramenta de análise legitimada nas áreas de Literatura, Ciências Sociais, História e Comunicação, entre outras.
O fetichismo que tomou conta da palavra "cultura" (descrito interpretativamente na primeira parte deste post) terminou por afetar os estudos culturais que, em muitos lugares, perderam seu cunho crítico e seu intuito original de intervenção política. Constantemente eles vêm se degenerando numa espécie de populismo eclético, produzindo trabalhos laudatórios e acríticos em relação aos temas e objetos culturais sobre os quais se debruçam.
Diante desse quadro, segue aqui um alerta para o trato com a "cultura" (e com os estudos culturais):
Desprezar a economia política, festejar o público e os prazeres do popular, deixando de lado questões de classe e ideologia e não analisar ou criticar a política dos eventos culturais são os caminhos mais rápidos para transformar a cultura em mercadoria (e os estudos culturais em mais uma subdivisão acadêmica inofensiva).
O recado foi dado.