Eu não sabia que tavam filmando, sorry...
Bom final de semana para todos! ; )
sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008
Acaso e nostalgia dos 90*
A memória é uma coisa engraçada. Um simples acaso é capaz de resgatar lembranças que eu já considerava mortas na minha cabeça. E ao fazer isto, o acaso frequentemente cria estruturas narrativas inteiras no meu juízo. Para alguns cronistas, ele é uma espécie de semente que faz brotar seus textos - com este bissexto aqui não é muito diferente, conforme mostra a pequena história que segue abaixo.
Pois bem, ontem ao sair de um shopping na zona sul do Rio, cruzei no corredor que dá acesso ao estacionamento com o músico e compositor João Bosco. O corredor estava completamente vazio, apenas nós dois trafegávamos por ele, um em cada extremidade, caminhando em trajetórias opostas até nos cruzarmos e seguirmos indiferentemente nossos destinos. Até aqui tudo normal, apenas um clássico do cotidiano carioca: cruzar com artistas nas ruas. Mas meu cérebro teimou que não.
De antemão aviso que não tenho nenhuma relação com o autor de “O bêbado e o equilibrista”, nada que pudesse me deixar comovido ou alterado emocionalmente. No entanto, nosso “encontro” me evocou um turbilhão de lembranças da década de 80 quando eu e um grupo de amigos (salve Karina, Paulinho, Pio, Rodrigo, Guga da Sé!...) tentávamos entrar nos shows que ocorriam no grande (mesmo!) teatro Guararapes do Centro de Convenções de Pernambuco. Como não tínhamos dinheiro, fazíamos de tudo para assistir aqueles que na época eram nossos ídolos (não, apesar de ótimo violonista e de sua citada canção ter dado nome a uma das paradas do Eu Acho é Pouco, acho que João Bosco não entrava no nosso rol). Lembro-me de várias ocasiões em que saíamos direto do colégio, ao meio-dia, rumo ao local do show para assistirmos a passagem de som do artista e depois irmos ficando nas coxias, fazendo-nos de lesos para que a produção ou os seguranças não dessem conta de nós. Eram horas de tensão e falta de comida – comumente ficávamos até o término do show sem comer! Quando conseguíamos algum convite, era motivo de festa, dava pra dar uma saidinha e beliscar alguma besteira. Passamos por inúmeras situações, desde de ter que saltar muros até percorrer corredores absolutamente escuros.
Com os anos 90 esse drama acabou. Nossos ídolos eram nossos amigos...
*Este textinho vai p/ Karina Buhr. Beijo Flôzia!!
terça-feira, 26 de fevereiro de 2008
Utilidade pública - filmes que vi na última semana
Semana passada tive o prazer de assistir seguidamente a 3 bons filmes. Passo as dicas:
O Tango de Rashevski (2003), de Sam Garbarski. Película francesa divertidíssima que trata dos dilemas de uma família judia heterodoxa após a morte de sua matriarca - vale muito a pena, pois o enredo é bastante engraçado e as questões culturais são tratadas de forma leve, cosmopolita, um filme super "do bem".
No Direction Home - Bob Dylan (2005), de Martin Scorsese. Documentário que traça um panorama da trajetória do cantor e compositor, desde o início de sua carreira até se tornar um dos grandes ícones da música contemporânea - é incrível a paciência esgotada de Dylan, tanto com o público quanto com a imprensa, na turnê européia que realizou em 1966. Tem ótimos depoimentos debochados do velho bardo!
A vida dos outros (2006), de Florian Henckel von Donnersmarck. Este é alemão e retrata a investigação de um escritor da antiga Alemanha comunista por um agente do governo que se sensibiliza com a vida do primeiro, livrando-o de ser preso - filme e narrativa clássicos que ganhou o Oscar de melhor filme em língua estrangeira (aos americanos) do ano passado.
Se puderem, façam bom proveito! Aquele abraço...
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008
Artigo novo!
Tem artigo novo na seção Textos outros desta bodega eletrônica! Chama-se Um passo à frente e você não está mais no mesmo lugar: o futuro como transcendência da miséria. É um texto que escrevi para uma (suposta) publicação que seria (será?) lançada por um convênio entre a UFRJ e a PUC-Rio sobre música e sociedade. Queriam alguém que escrevesse algo sobre música e Nordeste, então me prontifiquei. Estava esperando sair o livro para publicá-lo aqui, mas como o negócio parece que não tá andando (os organizadores não deram mais notícias), tomei a iniciativa de disponibilizá-lo. Apresentei este mesmo artigo (com pequenas modificações) na I Mostra Música & Mídia organizada pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), que ocorreu nos dias 17 e 18 de janeiro.
Bom, pra quem interessar, à disposição. Melhor só o precinho, o mesmo daquela velha toada do subcomandante ZeroQuatro: R$0,00...
domingo, 24 de fevereiro de 2008
Ato social de longo prazo - notas dominicais
"Quando tento resumir o que de mais importante aprendi ao enfrentar a difusa prolixidade da obra de John Dewey, chego à doutrina sucinta e fria de que pensamento é conduta e deve ser moralmente julgado como tal. Não é a idéia de que pensar é uma coisa séria que parece distinguir esse último dos filósofos da Nova Inglaterra - todos os intelectuais encaram as produções mentais com certa estima -, mas sim a tese de que o pensar é sério por ser um ato social, e de que, portanto, somos tão responsáveis por ele quanto por qualquer outro ato social. Talvez mais ainda, pois o pensamento é o ato social de maiores consequências a longo prazo."
Clifford Geertz em Nova luz sobre a Antropologia
quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008
Sobre Fidel, Cuba e o preço do mundo
Alguns acontecimentos históricos marcaram a minha vida. Posso enumerar alguns deles. Apesar de catástrofe natural, a cheia de Tapacurá foi o primeiro mediante a repercussão que causou no Recife, porventura a vila deste estranho dotô. Mesmo com pouca idade em 1975, lembro-me bem até hoje do "Deus-nos-acuda" causado pelo medo das torrentes d'água. Na época eu criava um bode (Berualdo, sua alcunha) que não aguentou esperar pela vazão do rio e deu um mosh do telhado onde se refugiava para ser levado pela correnteza para a eternidade (foram tantas lágrimas pela perda do bicho que quase inundei a cidade novamente). Para além desta tragédia pessoal, Tapacurá ficou marcado na história e no imaginário da capital pernambucana. Não era pra menos. Para se ter idéia, em vários lugares as marcas da altura da água chegaram aos 2 metros! O amigo cratense Xico Sá lembra que, logo que chegou no Recife de mudança, em toda esquina se escutava a narrativa deste dilúvio (hoje ela perde apenas para a trágica derrota do Naútico para o time de futsal do Grêmio).
Pois bem, sobrevivente de Tapacurá, tive a oportunidade de vivenciar outros fatos históricos com a mesma dimensão - pelo menos pra mim. Vou citar 3 deles na cronologia: a queda do muro de Berlim (1989, verdadeiro "perdido" na elite pecebista!); o atentado das Torres Gêmeas(2001); e, agora, a renúncia do comandante Fidel Castro (2008). É sobre este último acontecimento que gostaria de jogar umas palavras fora.
De antemão digo que Cuba me despertava (e ainda desperta) mais a atenção do que o seu ex-líder. Isto porque sou averso aos cultos personalistas em qualquer instância (essa coisa que, sobretudo, a indústria cultural adora). Fidel usou e foi usado por sua imagem como símbolo da revolução cubana até onde pode. Ele, como líder de movimento marcadamente popular, terminou se transformando em sua encarnação, o que não é lá muito legítimo... O mesmo ocorreu com seu companheiro Che Guevara, só que neste caso muito mais usado. Guevara sempre me pareceu um personagem mais interessante por sua busca de uma "revolução permanente", não aceitando cargos no governo revolucionário cubano e partindo para o front em outros lugares (como se sabe morreu na Bolívia depois de ter lutado em alguns países africanos). A anti-instituição em pessoa cuja apropriação "pop" sempre me causou uma estranheza repulsiva.
A admiração que carrego por Cuba, embora sem nunca ter posto os pés por lá, se deve basicamente a dois fatores. Um cultural e outro político. O primeiro se refere a vivacidade com que se apresenta sua cultura popular. Dois exemplos: a santeria, com seus "deuses que dançam" próximos do nosso candomblé, e, sobretudo, a música, com sua riqueza e variedade rítmica assombrosa. O segundo é um pouco difícil de explicar. Não se deve a política institucional cubana, que não deve ser de fácil convivência para seus habitantes. Por conta desta, sempre achei que o Recife, por exemplo, mesmo (ou sobretudo, o leitor que escolhe) o da zona norte - leia-se mais pobre -, deve ser um lugar mais divertido de se viver (que digam os músicos cubanos que lá se exilaram neste verão!). No entanto, para que eu não seja injusto, uma coisa não pode ser esquecida aqui: as condições sociais da ilha pós-revolução ficaram melhores do que nos tempo de Fulgêncio Batista - e isto não pode ser ignorado nem pela direita nem pela esquerda. Mas quando me refiro ao fator político é dentro de uma dimensão maior, não estritamente ao seu mecanismo interno, e sim no que diz respeito a um outro funcionamento possível no mundo. Eis o que politicamente Cuba representa para mim: a coragem da possibilidade de se viver fora da ordem neoliberal. Sei que talvez seja uma leitura generosa. E também sei que o preço importa - não torturaria ninguém por algo. Mas, por falar em preço, não esqueçamos que pagamos caro pelo mundo que nos é imposto...
Cuba sobreviverá independente de Fidel Castro. Sobreviverá nos cubanos, na resistência ao mundo da técnica e do consumo e, especialmente, na sua humanidade quente.
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008
O que é, afinal, Estudos Culturais?
Esta é uma pergunta que constantemente as pessoas me fazem quando falo sobre a área de conhecimento que desenvolvo meus trabalhos e a que, não por acaso, prefiro investir meus estudos. Para uma definição mais precisa dos Estudos Culturais existe hoje no Brasil uma bibliografia introdutória que responde bem a questão-título deste post. Cito algumas obras: Introdução aos Estudos Culturais, dos franceses Armand Matterlart e Erik Neveu; Dez lições sobre Estudos Culturais, da Maria Elisa Cevasco; O que é, afinal, Estudos Culturais?, organizado por Tomaz Tadeu da Silva; entre outros trabalhos.
No entanto, no meio das mencionadas leituras que fiz neste verão, encontrei uma definição interessante que serve de boa síntese para este campo de estudos. Ela encontra-se no livro O universalismo europeu, do sociólogo americano Immanuel Wallerstein. Eis a esclarecedora passagem:
"O movimento dos estudos culturais foi igualmente uma rejeição do conceito básico que configurava as ciências humanas: a existência de cânones universais de beleza e de normas do bem na lei natural que podem ser aprendidos, ensinados e legitimados. Embora as humanidades sempre tenham afirmado favorecer o particular essencialista (contra os universais científicos), os proponentes dos estudos culturais insistiam que os ensinamentos tradicionais das humanidades incorporavam os valores de um grupo específico - homens brancos ocidentais de grupos étnicos dominantes -, que afirmavam de maneira arrogante que seus conjuntos particulares de valores eram universais. Nos estudos culturais, insistia-se, ao contrário, no contexto social de todos os juízos de valor e, portanto, na importância de estudar e valorizar as contribuições de todos os outros grupos - grupos que foram historicamente ignorados ou denegridos. Professava-se então o conceito demótico de que todo leitor, todo espectador, traz às produções artísticas uma percepção que não é só diferente, como igualmente válida."
Respondida a pergunta-título?
terça-feira, 19 de fevereiro de 2008
Veja bem...
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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008
Leituras de verão e o (meu) materialismo posto em xeque
Desde novembro no Recife, aproveitei, entre uma farra e outra, pra por, na medida do possível, a leitura em dia. Romances, antropologia, filosofia, artigos, li de tudo um pouco. Eis a lista com a qual curei minhas ressacas e acumulei um pouco mais de sabidice: Música e simbolização, tese sobre o Manguebeat da professora e consultora de pesquisa Rejane Sá Markman; Homem comum, breve romance do americano Philip Roth; Beato Lourenço e Caballeros solitários rumo ao sol poente, ambos de Xico Sá; Nova luz sobre a Antropologia, Clifford Geertz; Administradores, quem somos nós?, Luiz Otávio Cavalcanti; Aprendendo a viver, do filósofo e ex-ministro da educação da França Luc Ferry; O Universalismo europeu, do sociólogo Immanuel Wallerstein; e, por fim, Crime e castigo, romance cânone da literatura mundial do russo Fiodor Dostoiévski, este último ainda em processo de leitura.
Pois bem, uns mais e outros menos, como era de se esperar, gastaram meu juízo com trechos e questões interessantes. Por hora, trago uma passagem do livro do Luc Ferry bastante provocadora para aqueles que, como eu, acreditam que a existência precede a essência:
"Para formular mais uma vez o princípio dessas contradições, eu lhe diria apenas que a cruz do materialismo é que ele jamais consegue pensar seu próprio pensamento. A fórmula pode parecer difícil; no entanto, significa algo de muito simples. O materialismo diz, por exemplo, que não somos livres, mas está convencido, é claro, de que afirma tal coisa livremente, que ninguém o obriga de fato a fazê-lo, nem seus pais, nem seu meio social, nem sua natureza biológica. Ele diz que somos inteiramente determinados por nossa história, mas não deixa de nos convidar a nos emancipar dela, a mudá-la, a, se possível, fazer a revolução! Ele diz que é preciso amar o mundo tal como ele é, reconciliar-se com ele, fugir do passado e do futuro para viver o presente, mas, como eu e você quando o presente nos pesa, não deixa de tentar mudá-lo na esperança de um mundo melhor. Em resumo, o materialismo anuncia teses filosóficas profundas, mas sempre para os outros, nunca para ele mesmo. Ele está sempre introduzindo transcendência, liberdade, projeto, ideal, pois, na verdade, ele não pode se acreditar livre e requisitado por valores superiores à natureza e à história."
Socorram-me o velho barbudo Karl e o bigodudo Friedrich! Para quem gasta neurônios com questões filosóficas, cartas a esta redação, por favor....
domingo, 3 de fevereiro de 2008
Redemoinho empoeirado na cabeça - notas dominicais e momescas
"O que é um homem sem um redemoinho empoeirado na cabeça?"
Xico Sá em Caballeros solitários rumo ao sol poente (capa ao lado)